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Família

O "neguinho" da família

Otávio Leal

Colunista On: Otávio Leal

Pai de Maria Flor e Amora, advogado, consultor parental e psicanalista em formação
O "neguinho" da família
Otávio Leal na infância | Foto: arquivo pessoal

 

Por muitos anos fui o "neguinho" da família. Ou ainda sou? Não sei ao certo...

Por ter a pela mais escura que a dos parentes da minha família materna, todas as "piadas e brincadeiras" sobre negritude eram direcionadas para mim, embora, para mim, nunca tenha soado como "piada ou brincadeira".

Lembro bem do dia em que, já cursando Direito, tendo adquirido mais autoestima, conhecimento e uma noção ampliada sobre mim, passei a reclamar daquela condição de inferiorizacão gratuita que tanto me constrangia.

Nesse dia conheci a revolta daqueles que possuem o desejo profundo de continuar sendo quem são, independente da dor do outro.

Naquele dia me acusaram de estar ficando "vaidoso" e "metido à besta", por estar cursando Direito. Imagine! Hoje em dia, eu seria taxado de "mimizento", diante dos que almejam liberdade de expressão/opressão.

Na verdade, era só um jovem querendo não ser alvo de um racismo estruturado, pronto e ávido por massacrar quem tiver mais melanina, cabelos crespos e um jeito atrevido de se manter vivo.

Um racismo tão duro que desconsidera a necessidade de garantir dignidade ao outro, crianças e adultos.

Por muitos anos aguentei calado e, por diversas vezes, me vi rindo da minha cor de pele e de todas as associações negativas que me faziam crer dela.

"Você tem esse jeito porque é assim, igual ao seu pai", sentenciava minha avó materna, enquanto esfregava o próprio braço com o dedo, indicando que o meu problema estaria na pele preta.

Nesse contexto, cresceu esse homem que agora lhes escreve, cheio de lembranças ruins, alguns traumas, mas também cheio de amor e de vontade de fazer algo que contribua para mudar o olhar da sociedade para essas crianças e jovens pretas.

Os parentes continuam amigos e eu continuo resiliente.

Atualmente vivo um dilema. Os pretos acham que sou branco e os brancos acham que sou preto.

Já eu acho que sou GENTE e que pertenço a um grupo de GENTE que tem a pele escura, mas que, justamente por ser GENTE, como todas as crianças e jovens de pele escura, merecem RESPEITO!

LEIA MAIS: Dia da Consciência Negra pode virar feriado nacional

*Este material não reflete, necessariamente, a opinião do Aratu On.

Otávio Leal

Foto de Otávio Leal

Otávio Leal, do blog "Pai, vem cá", é pai de Maria Flor e Amora, advogado, consultor parental, psicanalista em formação e autor do livro "Papai foi pra roça, Mamãe foi trabalhar. E agora?".

O projeto “Pai, Vem Cá!” se tornou parceiro da Defensoria Pública da Bahia e da Revista Pais & Filhos, tendo participado de iniciativas sociais importantes, a exemplo da campanha Poder do Colo, da Novalgina.

Instagram: @paivemca
 

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